Encontro Nacional de Cientistas em Portugal
Plataforma de
Cientistas conclui que deve ser realizada uma Auditoria externa ao
funcionamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia
Decorreu no passado dia 3 de Maio o Encontro Nacional de
Ciência, promovido pela Plataforma em Defesa da Ciência e do Emprego
Científico. Neste encontro, entre outros temas de interesse geral, foi abordada
a política de financiamento da investigação científica que tem sido seguida em
Portugal nos tempos mais recentes e as medidas que têm sido tomadas pela tutela
e pelos organismos com maior responsabilidade na execução destas políticas a
nível nacional. Foi analisado, em particular, o desempenho da Fundação para a
Ciência e Tecnologia (FCT) sob a orientação da sua actual Direcção na condução
das políticas de financiamento de recursos humanos e no seu relacionamento com
a comunidade de investigação científica nacional.
Desta análise resultaram as seguintes conclusões:
- A actual Direcção da FCT,
presidida pelo Prof. Doutor Miguel Seabra, tem adoptado uma postura
caracterizada pela ausência de diálogo com a comunidade científica. Tem
evitado a auscultação prévia de alguns dos principais representantes
institucionais e dos investigadores quando se trata de tomar decisões da
maior relevância para o sistema científico e tecnológico nacional (SCTN).
E tem recusado inflectir políticas obviamente inadequadas e corrigir os
erros da sua actuação mesmo quando estes se tornam flagrantes. Um exemplo
desta atitude, revelou-se quando em Fevereiro deste ano (2014) a FCT, sem
qualquer aviso prévio, anunciou a sua decisão de adoptar novos
procedimentos no exercício de avaliação de Unidades de Investigação que
estava em curso. Perante a reacção do Conselho de Laboratórios Associados
(CLA), que em comunicado público [1]
denunciou a falta de transparência de todo o processo e alertou para o
risco de se minar a confiança nos procedimentos de avaliação, a FCT
respondeu evasivamente, sem dar resposta às principais questões que lhe
haviam sido colocadas e mantendo a sua intenção de levar avante um
processo de avaliação opaco e com falta de rigor [2] [3].
- A
falta de transparência e as irregularidades processuais têm caracterizado
os mais recentes concursos e as avaliações realizadas sob orientação da
FCT. Estas falhas foram evidenciadas no concurso Investigador FCT 2013
(IF-2013), desde a fase de candidatura, passando pela fase de avaliação
onde as irregularidades observadas [4]
foram de tal ordem que causaram o descrédito generalizado no processo, e
culminando no anúncio da atribuição dos lugares e da contratação desses
investigadores antes da resposta às reclamações realizadas pelos
concorrentes em fase de audiência prévia. Como se tal não bastásse para
causar legítima apreensão no seio da comunidade científica, o concurso de
bolsas de investigação individuais de doutoramento (BD) e pós-doutoramento
(BPD) realizado em 2013 caracterizou-se igualmente por sérias
irregularidades que foram alvo de denúncia por membros dos painéis de
avaliação [5]
[6]
e acabaram em parte por ser reconhecidas pelos próprios responsáveis da
FCT.
- As
decisões tomadas pela FCT em matéria de financiamento da investigação têm
causado insatisfação generalizada
na comunidade científica. A redução drástica do número de bolsas de
pós-doutoramento e de doutoramento (ainda que contabilizando as anunciadas
BD dos Programas de Doutoramento FCT), aliada ao reduzido número de lugares
colocados a concurso para investigadores nos programas IF-2012/2013, que
não permitem sequer manter os efectivos em investigação que terminaram os
seus contratos ao abrigo dos Programas Ciência, consubstancia uma
acentuada redução no investimento em recursos humanos (RH) em Ciência e
Tecnologia. Este desinvestimento em RH conjugado com os cortes abruptos
que a tutela efectuou em 2012 e 2013 no financiamento das Universidades e
dos Laboratórios Associados [7],
fazendo tábua-rasa dos contratos pluri-anuais estabelecidos com o Estado,
coloca em risco de desaparecimento muitos centros de investigação. Esta
política contraria a estratégia aconselhada não só por analistas
independentes mas pelo próprio Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia
(CNCT), um órgão consultivo do Governo que, reconhecendo o atraso ainda
significativo da investigação nacional em comparação com a média europeia
segundo diversos indicadores, aconselha que “se evite um desinvestimento
nas universidades e na investigação, para que elas ganhem em vez de
perderem competitividade” [8].
São também claras as críticas recentes do CNCT à actuação da FCT por esta
não apresentar um plano estratégico de fundo, por não envolver a
comunidade na discussão das suas orientações e por realizar alterações
abruptas causadoras de forte instabilidade no sistema científico [9].
Importa também referir que, nos dois últimos anos, a FCT não tem tornado
públicas [10]
as estatísticas do investimento em investigação científica, apesar das
alegações de uma manutenção deste investimento ou mesmo de um eventual
aumento das verbas disponilizadas às instituições.
- Verifica-se
assim que a actual direcção da FCT tem tomado medidas avulsas e de
carácter disruptivo, invariavelmente associadas a cortes orçamentais,
tendentes a inverter a evolução positiva da investigação científica que se
vinha a observar na última década no nosso país. O facto de a FCT, em
consonância com a atitude da tutela, não revelar publicamente qualquer
estratégia de fundo nem discutir com os principais agentes e representantes
do SCTN as medidas que tem vindo a adoptar, cria um contexto de falta de
transparência francamente indesejável e
acentua o clima de insatisfação e de perda de confiança na actual
direcção daquela Fundação. Torna-se assim legítima a interrogação cada vez
mais corrente na comunidade científica e também na opinião pública sobre a
existência de alguma estratégia subjacente à actual política de
financiamento da ciência.
- Perante
estas conclusões, os membros da
comunidade científica presentes no encontro declaram a sua falta de confiança na actual Direcção da FCT e propõem que seja realizada uma
auditoria externa ao funcionamento
dos serviços da FCT que permita aferir da existência de uma estratégia
subjacente às políticas actuais, determinar o montante real das verbas geridas por
aquele organismo e avaliar a alocação dos recursos financeiros à
investigação científica nas suas diferentes vertentes.
A comunidade científica, através dos seus principais
representantes, tem demonstrado uma permanente abertura ao diálogo e estará
sempre disponível para apresentar propostas construtivas e para continuar a
contribuir activamente para a melhoria do desempenho do sistema científico
nacional. Torna-se no entanto necessária uma atitude igualmente aberta e construtiva
da parte da tutela e da FCT na condução das políticas nacionais ciência e tecnologia.
Referências:
[1] Comunicação do Conselho dos
Laboratórios Associados (CLA) à FCT sobre avaliação das Instituições de
Investigação – Março 2014 (http://www.cla.org.pt/docs/COMUNICADO%20SOBRE%20AVALIACAO%20enviado%20A%20FCT.pdf)
[2] Resposta da FCT enviada ao CLA - Conselho
dos Laboratórios Associados – 11 Março 2014 (http://www.cla.org.pt/docs/Resposta%20da%20FCT%20enviada%20ao%20CLA_11-03-2014.pdf)
[3] Reacção do CLA à resposta da FCT – 17 Março 2014 (http://www.cla.org.pt/docs/Reaccao%20do%20CLA%20a%20resposta%20da%20FCT.pdf)
[4] Documento preparado pela Plataforma em
Defesa da Ciência e do Emprego Científico sobre as "Irregularidades e
Ilegitimidades apontadas pelos candidatos ao concurso Investigador FCT
2013" – 24 Dezembro 2013 (http://empregocientifico.blogspot.pt/p/irregularidadese-ilegitimidades.html)
[5] Carta do Painel de Sociologia dirigida
ao Presidente da FCT – 20 Janeiro 2014 (http://www.aps.pt/cms/files/conteudos/file/DESTAQUES%20NEWSLETTER/Carta%20Presidente%20FCT%20Painel%20Sociologia.pdf).
[6] Carta da Associação Portuguesa de
Antropologia sobre o Concurso de Bolsas de Doutoramento e Pós-doutoramento da
FCT 2013 – 22 Janeiro 2014 (http://www.apantropologia.org/wp-content/uploads/2014/01/Carta-Prof-Susana-Matos-Viegas.pdf).
[7] Deliberação do Conselho dos Laboratórios
Associados – sobre financiamento dos Laboratórios e Unidades de
I&D – 19 Novembro 2012 (http://www.cla.org.pt/2013/Deliberacao%20do%20CLA%20-%2019%20nov%202012.pdf).
[8] Contributo Preliminar do Conselho
Nacional de Ciência e Tecnologia sobre o documento “Position of the Commission
Services on the development of Partnership Agreement and programmes in PORTUGAL
for the period 2014-2020” e Contributo para a negociação do Acordo de Parceria
na área da Ciência e Tecnologia –
23 Outubro de 2013 (http://media.wix.com/ugd/b605ff_807e487399204dfdb7f682793da1bd72.pdf).
[9] Reflexão e Recomendações do CNCT
sobre as recentes alterações às políticas nacionais de recursos humanos em
ciência e tecnologia – Janeiro de 2014 (http://media.wix.com/ugd/b605ff_40147131745a416ca86b811013624925.pdf).
[10] Não estão disponíveis as “Estatísticas
FCT — Investimento no Sistema Científico e Tecnológico Nacional” (http://www.fct.pt/estatisticas/global.phtml.pt), nem os “Relatórios de Actividades” (http://www.fct.pt/documentosdiversos.phtml.pt) da FCT para os anos 2012 e 2013 [última
consulta a 20 Maio 2014].
Encontro Nacional de Cientistas em Portugal
3 de maio de 2014 | 9.30 – 16 horas,
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas UNL,
Av. de Berna, 26-C, Lisboa
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas UNL,
Av. de Berna, 26-C, Lisboa
Ao longo das últimas décadas, sucessivas políticas têm levado a uma constante precarização da força de trabalho nas universidades. Esta precariedade atinge directamente os investigadores, mas indirectamente atinge todos porque o trabalho precário é uma pressão sobre salários, horários e condições de trabalho de quem tem contratos sem termo. Por outro lado, a precarização também atinge os que já estão reformados, pela erosão que origina no fundo da Segurança Social, devido à diminuição dos descontos.
O trabalho universitário tem diversos graus de progressão na carreira que não ignoramos. Mas a precariedade levou a uma fragmentação dos cientistas que não corresponde à realidade do trabalho que executam de facto. Na aparência jurídica, uma miríada de formas de trabalho distancia os trabalhadores da área científica – professores do quadro, investigadores, docentes convidados, a tempo parcial, investigadores pagos com bolsas de vários níveis, contratos Ciência ou Investigador FCT, etc. Mas, na essência, estas são formas de fragmentar a solidariedade e a cooperação, ambas essenciais ao progresso científico.
Paralelamente assistiu-se, sem qualquer debate na comunidade científica, à (suposta) mudança para novos “paradigmas” nos modelos de financiamento das instituições de ensino superior, nunca apresentados nem explicados.
O objectivo deste encontro é proporcionar uma oportunidade de debate a todos aqueles que queiram dar um contributo para alterar a situação do trabalho científico em Portugal. Esperamos que tenha uma ampla participação de docentes e investigadores, que seja discutido um amplo leque de problemas:
Que papel para a Universidade, dos Institutos Politécnicos, dos Laboratórios do Estado e dos Centros de Investigação na sociedade?
Como devem ser financiadas as instituições de Ensino Superior e Investigação?
Como, para quem e o que é que produzimos em ciência?
Qual o impacto da Ciência na economia portuguesa?
Como promover o emprego científico?
Apelamos a que as propostas enviadas sugiram um quadro de análise dos problemas, propostas de soluções e acções concretas a realizar.
A moldura organizativa deste encontro garantirá que as discussões e propostas são ouvidas, discutidas e votadas em plenário pelo conjunto dos participantes. Apelamos a todos que, mesmo que não enviem propostas, subscrevam e participem nos debates das propostas que terão lugar do Encontro.
Datas importantes
1 de Março – 10 de Abril: envio de propostas (letra 12, times new roman, máximo de 8000 caracteres (incluindo espaços), espaço 1,5).
Envio de propostas/moções/ textos para: encontronacionalcp2014@gmail.com
Neste período, todas as propostas serão colocadas online no blogue:
15 de Abril – Divulgação do programa final.
3 de Maio – Realização do Encontro
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